Escolas indígenas no Acre começam a receber alimentos produzidos em seus territórios
Dialogar, fazer articulações com instituições públicas, preparar projetos de venda e finalmente participar de uma chamada pública do Programa Nacional da Alimentação Escolar (Pnae) é um processo longo, que requer ações coletivas e de engajamento. Pequenas conquistas nesta caminhada são inspiradoras. Este é o caso da primeira entrega de alimentos produzidos pelos povos indígenas que ocorreu em 18 de agosto na Escola Indígena Kapjpaha, localizada na Terra Indígena (TI) Mamoadate, no estado do Acre.
A escola fica na aldeia Jatobá, e tem classes multisseriadas para crianças de idade variadas. “Ver esta entrega ser realizada é muito gratificante. Nós temos nos articulados aqui no estado há bastante tempo, organizando os processos para chegar neste momento da entrega e ver com alegria as crianças se alimentando destes produtos, produzidos localmente, com qualidade e com carinho”, comenta Paulo Roberto Lima Verde, da Emater Acre.
Além desta escola, mais sete irão receber estes alimentos no decorrer do ano de 2023. Estas entregas contemplam produtos como macaxeira, inhame, galinha caipira, peixe, melancia, mamão e banana comprida, além de hortaliças, e são oferecidos durante as atividades escolares. Dentro da TI Mamoadate, 18 produtores tiveram suas propostas de venda habilitadas em uma chamada pública realizada em março, para fornecer itens às escolas. Além de garantir uma alimentação mais adequada para as crianças, a consolidação da chamada também oportuniza um mercado complementar para a produção agrícola das famílias que vivem na TI Mamoadate.
Junto com a entrega, também foi realizada uma oficina na comunidade, para discutir a emissão do Cadastro Nacional da Agricultura Familiar (CAF), documento necessário para participar de diversas políticas públicas, além de temas como o cadastro de credor junto à Receita estadual e como preencher a guia de entrega junto ao Setor da Merenda Escolar.
Esta entrega é resultado de mais de um ano de articulações no estado, capitaneadas pela Comissão de Alimentos Tradicionais dos Povos do Acre (Catrapoacre). O processo permite o diálogo entre órgãos estaduais, como as Secretarias de Agricultura (Seagri) e de Educação, Cultura e Esportes (SEE) e da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater), Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Comissão Pró Índio do Acre (CPI), Organização dos Professores Indígenas do Acre (Opiac), Associação do Movimento dos Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre (Amaaiac), Slow Food Brasil e GIZ.
Esta chamada do Acre, assim como ocorre em outros locais do país, se baseiam na Nota Técnica nº 03/2020, que orienta formas mais adequadas de adquirir alimentação escolar em comunidades indígenas, quilombolas e de povos tradicionais. Este documento trata do autoconsumo entre esses povos, pois desde a produção até o consumo na escola estamos em um contexto familiar. Assim, os produtos de origem animal, como peixe, pato, galinha caipira, ovo, além de produtos de origem vegetal que são transformados em farinha de mandioca, beiju, goma ou farinha de tapioca, polpas e sucos de frutas, por exemplo, não precisam apresentar registros e/ou documentos sanitários porque são produzidos e consumidos dentro da própria comunidade ou território. Uma conquista para melhorar segurança alimentar e nutricional que crianças, ao mesmo tempo em que se respeitam práticas alimentares e se fortalece mercados para a agricultura familiar, de povos e comunidades indígenas.
Por meio do projeto Bioeconomia e Cadeias de Valor, apoiamos as ações no Acre desde 2021. Trabalhamos desenvolvendo estudos, apoiando processos de articulação e de assessoria e atividades de mobilização em campo. Este projeto é desenvolvido na Cooperação Brasil-Alemanha para o Desenvolvimento Sustentável, por meio da parceria entre o Ministério Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) e a Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit (GIZ) GmbH, com recursos do Ministério Federal da Cooperação Econômica e do Desenvolvimento (BMZ) da Alemanha.